Se você tem mais de 40 anos estes adjetivos parecem estar colados em sua testa, a frequência e naturalidade com que esta leitura acontece é tamanha que já estamos naturalizando e aceitando isto como fato. Surgem em conversas com amigos, entrevistas de empregos, artigos e postagens nas redes sociais, mas será que é uma verdade absoluta?

Você acredita nisto? Pois é, nem eu!

Lembro bem quando comecei a trabalhar em 1984, e já existia a mentalidade de que profissionais com mais de 40 anos eram antiquados, obsoletos e “velhos cheios de mania”, que não iriam se adaptar ao “estilo” da empresa e acabariam causando problemas. O curioso era que estas premissas foram proferidas por “velhos com mais de 40” que trabalhavam na empresa.

Também lembro de ter chegado ao mercado de trabalho cheio de motivações e ideias frescas, assim como muitos recém formados, entretanto me deparei com uma estrutura monolítica onde o maior principio era: “Em time que está ganhando, não se mexe”. Minha mentalidade novinha em folha foi submetida a sucessivas sessões de desestimulação, estava conhecendo a micropolitica corporativa e a tal da zona de conforto, onde se alojam os “dinossauros detentores de toda sabedoria corporativa”. Aos poucos fui aprendendo, ou melhor desaprendendo aqueles conceitos novos que trouxe comigo, e paulatinamente os fui substituindo por princípios e valores mais conservadores e antiquados. O curioso é que uma vez “iniciado” no ambiente corporativo foi minha vez de “ensinar” os calouros e regozijar junto aos meus pares veteranos.

“O revolucionário mais radical se torna um conservador no dia seguinte à revolução” Hannah Arendt

Independente da imaturidade do novato recém chegado ao mercado de trabalho, ele traz consigo uma bagagem de inovação que seria muito bem aproveitada por um bom líder.

Comecei a perceber a empresa como um conjunto de “pequenos reinos”, onde parte significativa da energia é gasta simplesmente para mantê-los, isto provoca um tremendo atrito, afetando a produtividade, a inovação e o desenvolvimento da empresa, que descrevo como a fricção funcional.

A fricção funcional pode se tornar elevadíssima, perde-se muito por causa de disputas micropolíticas, em geral estimuladas por aqueles que querem manter a zona de conforto, e são perpetuada pelos novos entrantes ao perceberem a “regra do jogo”. Os custos diretos e indiretos, e muitas vezes os prejuízos provocado pela fricção funcional são enormes. É importante destacar que muitos estudos apontam como positivo um certo nível de competitividade na empresa, a fricção funcional alinha-se mais com o ponto negativo desta competitividade, em geral opõem-se a ela, mas não é somente isto, existem outros componentes. Ela significa o aumento do “atrito” para o desenvolvimento empresarial, há um limite claro entre competitividade interna e fricção funcional – publicarei um texto sobre o tema em breve.

Esta fricção funcional também funciona como um filtro de talentos, deixando-os em geral fora da empresa, por conta do que descrevi em “Síndrome da estagnação corporativa“, o que em linhas gerais significa que quase ninguém contrata um candidato que possua um currículo melhor que o seu.

Esta é mais uma das razões que “justifica” a mentalidade de que os candidatos com mais de 40 anos são “antiquados e obsoletos”. Estes profissionais trazem consigo uma bagagem que para o futuro chefe pode ser um verdadeiro cavalo de Troia. Imagine que ele vai trazer para a empresa práticas e valores que podem ser melhores do que os eternizados pelos “dinossauros detentores de toda sabedoria corporativa”, olha que perigo! Na teoria este intercâmbio é desejável e positivo, mas na prática parece ser uma terrível ameaça a zona de conforto de muita gente. Não só observei como participei de algumas “sabotagens” à algumas destas terríveis ameaças para preservar “meu reino”.

Novo chefe, porque não me escolheram? Vamos “detona-lo” antes que me demita!

Seria injusto da minha parte não relacionar outras razões que constroem a mentalidade contra candidatos mais velhos. Profissionais experientes costumam ser mais práticos e objetivos, afastam de questões micropolíticas do “baixo clero”, e não possuem mais a ambição dos mais jovens, compreendem perfeitamente o seu lugar e onde podem chegar, mas também possuem seu conjunto de princípios e valores construídos ao longo de sua carreira e da vida, que podem necessitar ajustar e/ou somar aos existentes na empresa.

O ambiente corporativo parece conter uma série de paradoxos que dificultam alinhar o discurso inovador com a prática conservadora, basicamente só vemos isto de fato em start-up que possuem um time mais focados nos objetivos da empresa do que na própria estabilidade. Na start-up o funcionário sente-se comprometido com os resultados, e literalmente no “mesmo barco” com os demais colegas e chefes, há uma cumplicidade proativa.

O rótulo de “obsoleto e antiquado” muitas vezes se aplica às próprias empresas, que bloqueiam a inovação e se tornam mais pesadas por causa da fricção funcional.

O deslocamento da perspectiva ao longo dos últimos quarenta anos

Grafico Idade

Na década de 70, segundo a ONU, a média da idade dos Brasileiros era de 18,7 anos e 59% da população economicamente ativa – tinha entre 20 e 39 anos, e 41% entre 40 e 74 anos. Com uma população extremamente jovem, não é difícil imaginar como surgiu a mentalidade de que profissionais acima de 40 anos eram velhos demais. Em 2015, 45 anos depois, a média da idade dos Brasileiros subiu para 31,3 anos e estima-se que em 2050 a média da idade dos Brasileiros chegue à 45 anos. Em 2015 50% da população economicamente ativa tinha entre 20 e 39 anos e assim como os que tinham entre 40 e 74 anos, e em 2050 esta proporção deve chegar à 34% entre 20 e 39 anos e 66% entre 40 e 74 anos, ou seja, 2/3 da força de trabalho em 2050 terá mais de 40 anos.

Com este envelhecimento da população e com a respectivo aumento da qualidade de vida, não só a expectativa de vida aumenta, como a expectativa de vida com qualidade, hoje uma pessoa de 60 anos é muito mais dinâmica e ativa do que há décadas. Com 40 ou 50 anos, ainda está cheia de energia, e muitos continuam estudando, fazendo pós graduação, MBA e cursos de especialização, o mercado precisa acompanhar este desenvolvimento, um profissional com mais de 40 anos ainda tem muitos anos de produtividade pela frente.

O novo desafio das empresas é quebrar o tabu e mudar a mentalidade de que profissionais com mais de 40 anos são antiquados e obsoletos, e aproveitar todo potencial que este profissional experiente tem a oferecer.


Publicado originalmente no LinkedIn Pulse em 29/11/2017


João Carlos Rebello Caribé

Consultor em otimização empresarial, com foco em inovação estratégica, gestão do conhecimento, gestão de projetos e processos, e micropolítica corporativa. Professor em MBA em disciplinas das áreas de gestão Empresarial, Marketing, Logística e Recursos Humanos. Mestre em Ciência da Informação pela UFRJ (PPGCI) com o tema “Algoritmização das relações sociais, criação de crenças e construção da realidade”. Empreendedor desde o início de sua carreira, foi sócio em quatro empresas desde então. Com a chegada da Internet no Brasil no final dos anos 90, desenvolveu uma empresa revolucionária, a Flash Brasil, tornando-se referência com um modelo de negócios inovador envolvendo comunidades virtuais com milhares de profissionais. Foi conselheiro para o primeiro Conselho de Coordenação da NETmundial Initiative, junto com profissionais como Jack Ma (Alibaba), Christoph Steck (Telefonica), Penny Pritzker (Departamento de Estado Americano), James Poisant (WITSA), Lu Wei (Ministro do Ciberespaço Chinês), Jean-Jacques Subrenat (EURALO), dentre outros. Também foi membro do Comitê Executivo da NCUC na ICANN, representando a sociedade civil da América Latina e Caribe. Participa da Internet Society Brasil, Coalizão Direitos na Rede, Red Latam, Comunidade Diplo, Dynamic Coalition on Network Neutrality e Global Net Neutrality Coalition, Laboratório em Rede de Humanidades Digitais (LarHud) e Estudos Críticos em Informação, Tecnologia e Organização Social (Escritos).

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